Clínica na instituição e a formação do analista: sobre transmissão em psicanálise
- Artur Linck

- 3 de jul.
- 14 min de leitura
Em psicanálise, podemos dizer que a experiência com o tempo é algo fundamental tanto para o analisante, como para o analista. Claro que não o tempo cronológico do dia a dia dos nossos calendários e relógios, mas um tempo que Lacan, não por acaso, esquadrinhou não somente no seu texto sobre o tempo lógico, mas quando pinça do texto freudiano o conceito de só-depois (nachträglich) para caracterizar a atemporalidade, o tempo próprio do inconsciente. Isso nos indica que sempre estamos de certa forma “atrasados” em colher os efeitos de algo que é colocado em movimento, já que um tempo de trabalho é necessário para algo “decantar” daí. Em outras palavras, somente após certo tempo é que podemos recolher algumas migalhas do percurso percorrido até então.
Em nossa clínica essa questão com o tempo está colocada em cada escuta realizada: nas perguntas que ainda não foram feitas, nos ditos que antes não eram possíveis, nos sintomas que se repetem, num sonho revelador após uma intervenção do analista, enfim, tempos que se desenrolam nos laços transferenciais. A própria idéia de saber inconsciente e suas cadeias significantes, as metáforas e metonímias, insinuam a questão do tempo como algo que descentra o sujeito na sua relação com a vida, algo que Freud comparou com uma revolução copernicana: não somos reis em nossa morada. Existe uma Outra cena que se coloca para cada sujeito e essa não está dependente do seu relógio.
Bem, esses efeitos do tempo também obviamente se colocam na formação do analista, que ao se colocar nessa empreitada (e haveria outra escolha?) vai poder reconhecer que algo se deu no só-depois.“A transmissão nunca é antecipada, exige um tempo, é sempre a posteriori. Nessa medida, só depois da experiência vivenciada pode-se falar em efeitos de aprendizagem via transmissão.” (BROIDE, 2017, p.69). Dessa forma, isso implica um se colocar na experiência e ser tomado por ela, conforme nos coloca Heidegger:
Fazer uma experiência com algo, seja com uma coisa, com um ser humano, com um deus, significa que esse algo nos atropela, nos vem ao encontro, chega até nós, nos avassala e transforma. “Fazer” não diz aqui de maneira alguma que nós mesmos produzimos e operacionalizamos a experiência. Fazer tem aqui o sentido de atravessar, sofrer, receber o que nos vem ao encontro, harmonizando-nos e sintonizando-nos com ele. É algo que se faz, que se envia, que se articula (HEIDEGGER, 2003, p.121).
Acredito que são algumas migalhas desse percurso de formação em psicanálise que pretendo registrar nesse escrito, expondo algumas reflexões sobre a formação e transmissão analítica dentro da instituição psicanalítica. Formação essa que colocou em cena a prática clínica e seus dispositivos, tendo como questão central, do meu ponto de vista, a transmissão daquilo que apenas o estudo teórico não poderia dar conta.
Ao iniciar a escrita desse trabalho, e já recolocando a questão com o tempo, me dou conta de que a questão da formação do analista e a problematização da transferência nos espaços institucionais são coisas que estão em questão para mim desde a graduação em psicologia. Lá já me perguntava sobre as possibilidades dessa formação no âmbito acadêmico da clínica-escola, que relações são possíveis entre psicanálise e universidade, problematizando a supervisão professoral nesses espaços e colocando a importância da experiência clínica como motor da formação. A formação em psicologia, muitas vezes tecnicista e teórica, acaba por deixar de fora a experiência da clínica, ignorando os efeitos da transferência e priorizando protocolos e “modos certos” de fazer. Dessa forma, acaba por retirar da cena do tratamento o seu principal interessado: o próprio sujeito.
Mas também não podemos esquecer que até mesmo dentro do movimento psicanalítico há modelos de formação com essa formatação. Se focarmos aqui nas instituições criadas com esse objetivo, não há como não mencionar a experiência inaugural do Instituto Psicanalítico de Berlim em 1920 e suas várias recomendações para tentar dar conta da formação analítica (APPOA, 2005). Hoje sabemos que esses modelos formulados por instituições ligadas à IPA trouxeram padronizações, exigências, fórmulas e recomendações rígidas que acabam por degradar justamente aquilo que a psicanálise nos brinda: a experiência do inconsciente.
Foi tecendo uma crítica da situação da psicanálise e do modo como se dava a formação dos analistas em sua época que Lacan começou a trilhar seu ensino. Seu retorno aFreud, além de trazer novos ares para a teoria psicanalítica, colocou a formação do analista em outros termos. “Pois, se pudemos definir ironicamente a psicanálise como o tratamento que se espera de um psicanalista, é justamente a primeira, no entanto, que decide sobre a qualidade do segundo” (LACAN, 1998c, p.462).
Mas eis que me encontro hoje falando de outro percurso de formação, agora em uma instituição psicanalítica, com outros contornos e destinos possíveis. O Percurso da APPOA sofreu algumas transformações na sua proposta de ensino a partir de 2015. Configurando-se até então como um espaço apenas de estudo da teoria psicanalítica, a instituição, após amplo debate entre seus membros, resolve apostar na prática clínica para os participantes do Percurso como mais um elemento do seu quadro de ensino. Proposta esta que modifica não somente a proposta desse espaço de formação, como também a própria clínica da APPOA, transformando a relação da mesma com a cidade.
No que diz respeito à oportunidade da prática clínica no espaço do Percurso, isso se coloca como um grande desafio e condizente com a práxis psicanalítica, já que promove a experiência da clínica na instituição na formação do analista. Nunca é demais lembrar que foi a partir dos efeitos da transferência na escuta de seus analisandos que Freud colocou para o mundo a questão do inconsciente. “Assim como o movimento se experimenta ao andar, ser analista é um fato que se experimenta no discurso que determina a relação do analista com as questões que a experiência do inconsciente coloca para ele” (SAFOUAN, JULIEN, 1996, p.38), pontua Moustafa Safouan, lembrando que a clínica e seus impasses é que faz o analista avançar. Freud foi formulando e reformulando suas hipóteses, voltando atrás em construções feitas e propondo novas, justamente como um viajante que vai registrando suas aventuras e corrigindo seu rumo.
Mas falar especificamente sobre a clínica da APPOA, após a mencionada mudança e seus efeitos para a instituição, talvez necessite de alguns ciclos mais para que algo decante dessa experiência. Muitas pessoas ainda passarão pela equipe, já que há um tempo máximo de permanência dos praticantes do Percurso. Essa circulação de pessoas, assim como talvez possa colocar questões para a sua continuidade, inegavelmente também trará uma diversidade de olhares que acabam estimulando e enriquecendo futuros debates. Tempos por vir!
Deixando então essa discussão institucional mais ampla de lado por ora, o que hoje, a partir desse tempo de prática clínica na APPOA, posso dizer que deixou e continuará deixando marcas em minha formação? Acredito que um espaço de formação como o Percurso adquire outras cores quando traz a clínica para perto, entrando em cena muito mais fortemente a questão da transmissão da psicanálise.
Emília Estivalet Broide vai trazer em suas discussões o quanto em psicanálise, quando se fala em transmissão, está se falando da transmissão da experiência. A autora faz uma importante e esclarecedora diferença entre transmissão e ensino, colocando que “a intenção do ensino é a aquisição de conhecimento; [...] O ensino volta-se para um saber sistematizado. Implica, muitas vezes, o exílio do traço ou vestígio do sujeito da enunciação – daquele que fala além dos ditos” (BROIDE, 2017, p. 69). Esse exílio ou retirada de cena do sujeito da enunciação é algo que deve ser grifado quando discutimos a formação do analista.
Quando falamos de sujeito da enunciação, estamos colocando que aquele que fala se reconhece naquilo que diz, é uma fala implicada com o dizer, uma fala apropriada e que supõe certo tempo de trabalho para ser formulada, sem meras repetições ou citações. Ou seja, o sujeito da enunciação se coloca naquilo que diz, ele tem a ver com aquilo que elabora e isso lhe diz respeito de alguma forma. Já o sujeito do enunciado é justamente a fala vazia, a mera repetição de algo dito onde não reconheço algo meu ali em jogo. E isso tem consequências cruciais quando se fala em formação do analista!
Não é por acaso que Lacan coloca que não há formação do analista, mas formação do inconsciente, evidenciando assim a dimensão de implicação do mesmo nessa empreitada. É difícil imaginar que um analista que se propõe à escuta do inconsciente não tenha passado por essa experiência como analisando, daí a importância da sua análise pessoal para conseguir sustentar os lugares em que seus futuros analisandos o colocarão na transferência. Será que não fica colocada aqui a inviabilidade de conceber a psicanálise como uma técnica ou conjunto de procedimentos clínicos?
Se bem lembrarmos os artigos sobre a técnica, vamos ler um Freud que traz suas recomendações aos que pretendiam se lançar na prática analítica e não regras a serem seguidas. No artigo O início do tratamento, ele já inicia uma comparação com o jogo de xadrez, colocando o quanto o início e o fim poderiam ser descritos, mas que a partida em si não teria essa formalização. Fica implícito que o analista teria que jogar esse jogo, sabendo dos efeitos de suas jogadas na transferência somente depois. Nas palavras de Freud:
Mas farei bem em designá-las como “recomendações” e em não reivindicar sua obrigatoriedade. A extraordinária diversidade das constelações psíquicas envolvidas, a plasticidade de todos os processos anímicos e a riqueza de fatores determinantes resistem à mecanização da técnica (FREUD, 2010c, p.164).
Em outro artigo dessa série chamado Recomendações ao médico que pratica a psicanálise, novamente no início do texto ele coloca que são recomendações que serviram para ele e que talvez para outros analistas isso não seja relevante e possa se dar de outras formas. Como não localizar nas palavras de Freud algo que escapa do receituário técnico e mira na transmissão da Psicanálise?
Trazendo novamente Emília Broide, ao diferenciar o ensino da transmissão, ela coloca que a experiência é colocada em primeiro plano para essaúltima:
[...] a transmissão requer a passagem pela experiência; é ato de linguagem que passa pela admissão do real em jogo em qualquer processo comunicativo ou informacional [...] produz-se na relação transferencial estabelecida em uma situação específica, uma vez que a comunicação por si só não produz a experiência (BROIDE, 2017, p.69).
Percebe-se que há um algo a mais trazido com a ideia de transmissão, pois há a dimensão do impossível de ensinar, que não é passível de generalizações ou padronizações. Mas também vai ficando mais claro nessa discussão sobre a transmissão algo que diz respeito à importância do laço transferencial do analista com a psicanálise e a instituição na qual se engaja para dar conta da sua formação. Instituição essa que possui uma filiação teórica que fala de uma posição perante o sofrimento e a condição humana e que, por sua vez, o analista decide inscrever ali sua prática.
Sendo assim, ao me lançar no Percurso da APPOA, explicito minha transferência com a instituição e com a própria psicanálise, inscrevendo minha formação e minha clínica nesse espaço. Antonio Quinet coloca que essa escolha nada tem de neutra, sendo que “todo psicanalista fala a partir do lugar de sua inserção na comunidade psicanalítica, inscrevendo-se a favor ou contra esse lugar, que é determinado para cada um por sua escolha” (QUINET, 2009, p.53). Escolha essa baseada na aposta de uma formação que se dá pela via da transferência de trabalho, “em que o ensinante dividido por uma questão (S) endereça sua elaboração de saber àquele (S1) que ele pretende que produza também um saber (S2)” (QUINET, 2009, p.56). Assim, podemos dizer que só há formações singulares, em tempos singulares, com questões singulares, sendo a instituição um espaço onde essas singularidades têm meios de trabalho.
Se a formação se coloca como singular, e aqui a ideia de estilo trazida por Lacan faz-se reconhecer, rompe-se de imediato a ideia de ideal de analista tão presente nas formações propostas pela IPA. A instituição analítica, assim, propicia que transferências de trabalho se construam ao redor de um furo: a ausência do conceito preestabelecido do analista. “Eis por que a Escola se estrutura em torno da questão sobre o analista e sua formação, estabelecendo dispositivos para que as respostas possam ser cada vez mais fundamentadas, fazendo assim progredir a psicanálise” (QUINET, 2009, p.91).
Colocando o Percurso como sendo esse espaço onde a questão do que é o analista possa ser feita e sua resposta começar a ser construída, é inegável a potência da entrada da clínica nesse contexto. Percebo que um corte foi produzido a partir do momento em que iniciei meus atendimentos clínicos, possibilitando assim outros sentidos possíveis ao meu percurso feito até então. Assim, que questões foram essas? O que a singularidade da clínica nesse espaço pode contribuir para a formação do analista? Que transferências estão colocadas e quais seus efeitos?
Acredito que não há como não introduzir de cara uma das principais diferenças com a clínica do consultório privado, algo que muito discutimos em nossas reuniões nesses primeiros tempos de trabalho coletivo na APPOA. Em nossa clínica particular é muito comum uma pessoa chegar até nós para atendimento através da indicação do nosso nome e endereço. Recebemos essa pessoa em nosso consultório e talvez essa situação, pelo menos em um primeiro momento, possa proporcionar um pequeno “engodo” ao analista de que falam com ele, por mais bem advertido que esteja de que nunca é esse o caso. Engodo imaginário, sem dúvida, e que pode trazer efeitos desastrosos para a direção do tratamento quando o que o fundamenta é uma relação a dois. Em seu texto de 1955 dos Escritos chamado A coisa freudiana, Lacan vai criticar claramente essa idéia, dizendo que “não há na situação analítica apenas dois sujeitos presentes, mas dois sujeitos providos, cada um deles, de dois objetos, que são o eu e o outro, tendo esse outro o índice de um a minúsculo inicial”. (LACAN, 1998a, p.431). Mais adiante ele sustenta que a posição do analista seria a do morto para que a dimensão Outra da transferência pudesse se distinguir.
Em outro importante texto de 1958,A direção do tratamento e os princípios de seu poder, ele desmonta ideias da época como a contratransferência, ego autônomo e o analista como aquele que iria corrigir a relação do sujeito com a realidade, inclusive se colocando como modelo para o analisante. O analista é “menos seguro de sua ação quanto mais está interessado em seu ser.” (LACAN, 1998b, p.594) A dimensão simbólica da transferência colocada em movimento pela fala e o Outro para o qual o sujeito dirige a palavra estão de fora nessa perspectiva, já que é de uma discussão entre dois indivíduos que se trataria. Mas como coloca Freud em Observações sobre o amor de transferência, nossas verdadeiras dificuldades estão no campo transferencial, advertindo o praticante do quanto ele está exposto ao logro do endereçamento feito pelo analisante e é a partir desse Outro lugar que ele terá de operar.
Na instituição, a pessoa que procura por atendimento não chega através do nome de um analista, mas pelo nome da instituição indicado por um amigo, pela sua transferência com a psicanálise, pela proximidade da sua casa, enfim, os meios são os mais diversos. Pois bem! Como não há indicações de nomes a priori, não pude deixar de perceber que a radicalidade da transferência se coloca mais acentuadamente. O analista na instituição, ao ser o destinatário do endereçamento do futuro analisante nas entrevistas iniciais, sente o peso e a responsabilidade de falar daquele lugar, além de ter a chance de perceber mais nitidamente que é apenas o suporte da “roupa que lhe veste” o analisando. Essa experiência desloca sua figura/pessoa de forma muito mais marcante do que no consultório particular, algo que acredito que operou um importante efeito em minha clínica, pois esse Outro lugar onde sou colocado pelo analisante traz notícias do engodo necessário da transferência. Seria a instituição uma “facilitadora” desse engodo, já que ao “limpar” as marcas narcísicas do analista através do anonimato, pelo menos inicialmente, facilitaria o mesmo a se colocar como objeto na transferência?
Quando Lacan nos fala que a resistência é sempre do analista, é para nos lembrar que devemos atrapalhar o menos possível a tomada transferencial efetivada pelo analisando, sendo condição que nos deixemos ser tomados como objeto e operar a partir dali. Ou seja, quanto menos o analista aparecer enquanto eu, mais chances há de estar em um lugar interessante para o andamento da análise.
O preço é abdicar de seu ser, des-ser (que é equivalente à “falta-a-ser do analista” revisitada pela teoria do objeto a), para poder bancar o objeto a para o analisante e abdicar de seu nome para poder ser reduzido ao significante qualquer Sq com o qual o sujeito o investirá na transferência. (QUINET, 2009, p.37).
É essa a idéia que Lacan vai trazer quando menciona que o analista é menos livre em sua estratégia do que em sua tática. “O analista é ainda menos livre naquilo que domina a estratégia e a tática, ou seja, em sua política, onde ele faria melhor situando-se em sua falta-a-ser do que em seu ser” (LACAN, 1998b, p.596). Quinet frisa essa dimensão política do texto A direção do tratamento..., sustentando o quanto a questão do poder delegado ao analista pelo analisante está presente na transferência, e que a falta-a-ser do analista é de certa forma uma estratégia para que um tratamento possa acontecer. Sustentar esse apagamento ou a política da falta-a-ser implica necessariamente que o próprio analista possa passar pela experiência de análise, vivenciando sua condição de sujeito do inconsciente. Como nos lembra Dominique Fingermann, “o agente da psicanálise é produzido e só pode ser produzido pela sua operação. Ninguém pode conduzir a experiência psicanalítica sem ter atravessado e ter sido transformado (deformado) pela experiência mesma” (FINGERMANN, 2016, p.33).
Dessa forma, posso dizer que talvez a instituição, ao ser a destinatária inicial da transferência que dá o pontapé inicial do tratamento, coloca em destaque muito maior o caráter de ficção desse laço, produzindo um espaço maior entre a pessoa do analista e a demanda que lhe chega. Assim, a clínica na APPOA me colocou frente a situações muito próprias desse lugar e que eu pouco provavelmente vivenciaria neste momento de meu início de clínica. Foi em um caso em específico, onde um pedido de análise estava atravessado por uma demanda de formação (inclusive com a intenção de iniciar o Percurso da APPOA), que interrogações surgiram mais fortemente. Obviamente é possível receber psicólogos com esse tipo de pedido no consultório, mas acredito que escutar alguém em uma instituição psicanalítica que tem como objetivo possibilitar a formação do analista e onde eu mesmo inscrevo minha formação foi algo que evidenciou uma dimensão não percebida da transferência até então. Além disso, acredito que há também um próprio dar testemunho / provas da formação, agora colocado em ato em transferência.
Mas quais questões surgem para a formação do analista nesse encontro de diferentes tempos: o analista em início de formação, ainda se havendo mais fortemente com muitas coisas da clínica (e inclusive com sua própria análise!), com o sujeito que demanda tratamento colocando também sua formação em jogo? Será que há algo da responsabilidade em sustentar o discurso psicanalítico nesse contexto transferencial, ou seja, na instituição? O “sentir o peso” de estar nesse lugar transferencial, conforme mencionei anteriormente no texto, talvez fale dessas questões. Acredito que esse peso adquire essa importância e função significativa, por estar inserido num determinado tempo de minha formação, e só poderia adquirir tal importância nesse momento: desdobramentos dessa experiência com o tempo? Tempos únicos de cada um, com voltas imprevisíveis, durezas necessárias, amarrações provisórias.
Para finalizar, chamo a atenção da importância da sustentação da APPOA na prática clínica no Percurso em Psicanálise, já que ao oportunizar a escuta nesse espaço permite a cada um que ali se insere a vivência na carne dos seus efeitos no âmbito institucional. Efeitos que vão reverberando e criando corpo nas análises, supervisões, estudos e na clínica de cada um. Isso diz de um oferecimento de um lugar para o qual uma formação seja possível de acontecer, priorizando a construção de um estilo próprio. Posição ética frente à formação do analista, atenta aos tempos de cada um, com a condição desejante e não se colocando na posição de “produção de analistas em série”.
Uma Escola que determine um estilo a seus membros, uma Escola que imponha um estilo é aquela que funcionará como Outro. Consequentemente, as pessoas terão seu estilo marcado a partir desse endereçamento, o que vai contra o discurso do analista, pois o estilo é tributário do objeto a, causa de desejo (QUINET, 2009, p.184).
REFERÊNCIAS
BROIDE, Emilia Estivalet. A supervisão como interrogante da práxis analítica: Desejo de analista e a transmissão da psicanálise. São Paulo: Escuta, 2017.
FINGERMANN, Dominique. A (de)formação do psicanalista: As condições do ato psicanalítico. São Paulo: Escuta, 2016.
FREUD, S.. Observações sobre o amor de transferência (1915). In: Observações psicanalíticas sobre um caso de paranoia relatado em autobiografia (“O caso Schreber”), artigos sobre a técnica e outros textos/ Sigmund Freud; tradução e notas Paulo Cézar de Souza. Rio de Janeiro: Companhia das Letras, 2010a, p. 210-228.
FREUD, S.. Recomendações ao médico que pratica a Psicanálise (1912). In: Observações psicanalíticas sobre um caso de paranoia relatado em autobiografia (“O caso Schreber”), artigos sobre a técnica e outros textos/ Sigmund Freud; tradução e notas Paulo Cézar de Souza. Rio de Janeiro: Companhia das Letras, 2010b, p. 148-162.
FREUD, S.. O início do tratamento (1913) In: Observações psicanalíticas sobre um caso de paranoia relatado em autobiografia (“O caso Schreber”), artigos sobre a técnica e outros textos/ Sigmund Freud; tradução e notas Paulo Cézar de Souza. Rio de Janeiro: Companhia das Letras, 2010c, p. 164-192.
HEIDEGGER, Martin. A Caminho da Linguagem; Tradução de Marcia Sá Cavalcante Schuback. Rio de Janeiro: Editora Vozes, São Paulo: Editora Universitária São Francisco,2003, p.121-171.
LACAN, Jacques. Acoisa freudiana ou Sentido do retorno a Freud em psicanálise (1955). In: Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998a.
LACAN, Jacques. A direção do tratamento e os princípios de seu poder (1958). In:Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998b.
LACAN, Jacques. Situação da psicanálise e formação do psicanalista em 1956. In: Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998c.
QUINET, Antonio. A Estranheza da Psicanálise: a Escola de Lacan e seus analistas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2009.
REVISTA DA ASSOCIAÇÃO PSICANALÍTICA DE PORTO ALEGRE / Associação Psicanalítica de Porto Alegre. - n° 29, 2005. - Porto Alegre: APPOA.
SAFOUAN, Moustapha, JULIEN, Philippe, HOFFMANN, Cristian. O mal-estar na psicanálise. Campinas: Papirus, 1996.
Trabalho apresentado no Sarau do Percurso em Psicanálise, turma XIV em 1 de julho de 2016.
Link do artigo na Revista APPOA, clique aqui.



Comentários